segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O causo do Anão fluorescente.

Silvano e o anão fluorescente 


Thiago Oliveira

Era mais uma tarde ensolarada na cidadezinha de Tripolândia quando o velho grupo de amigos se reuniu na venda do seu Odair para mais uma roda de conversa e o tão aclamado apreciar da boca cachaça mineira. Já era de se esperar que eles começassem as apostas acerca da nova história mirabolante que seria contada por Silvano. Entre várias ideias, chegaram até cogitar um tubarão de água doce que saia todas as noites para flertar com Dona Germana, uma velha rabugenta que passava horas na porta de sua casa cuspindo no chão e chamando a todos que atravessavam a rua de "gente besta". Enfim, não foi dessa vez que acertaram, por mais que se pudesse esperar uma história de tamanha bizarrice. A história contada por Silvano aquele dia podia não envolver tubarão e velhas com humor de uma porta rachada, mas com certeza não ficaria muito atrás. E vocês descobrirão o porquê. 
Naquela tarde, enquanto todos do grupo fechavam as apostas, chegou Silvano, e com a língua mais afiada que nunca, começou a tecer as palavras como quem tecia o mais rico tapete persa. 

__ Muito boa tarde a todos. Já imagino que estão a falar de mim. Mas antes que me digam algo, saibam que quase morri, não faz nem vinte quatro horas.
__ Como assim Silvano? Vai inventar sua morte agora? Disse Terêncio, um dos mais céticos do grupo, quando se tratava das histórias de Silvano.
__ Oxê! Disse Silvano com uma altercação de espanto levando a mão ao primeiro copo de cachaça que encontrou no balcão. __ E desde quando invento Histórias? Quem quiser que não acredite, mas tudo que conto é caso verídico e de boa fé.
E com dedo em riste, olhou pra Terêncio e disse, depois de dar mais uma golada: __ Você que fique esperto, Terêncio! Tomara que esbarre com o anão, quero ver depois vir me dizer que eu estava certo.
__ Anão!? Perguntou Terêncio, enquanto olhava para os companheiros na esperança de ganhar um apoio para sua pergunta. __ Que história é essa? Nem tem anão aqui em Tripolândia. To achando que foi visitar seu amigo invisível, o tal do Cuei. E todos no bar deram uma risada desconfiada, já esperando a resposta nervosa de Silvano.
__ Vou te dizer viu!? Olhe só, vou contar pra vocês, e não se assustem, mas a coisa foi feia. 
Nisso, todos já se empertigaram e ficaram atentos às palavras que se seguiriam. Até mesmo seu Odair, que se ocupava em bater uns panos de mesa do lado de fora da venda, veio correndo aos tropeços para ouvir a mais uma das mirabolantes histórias de Silvano, que desde o causo com o sapo carreteiro, sempre começavas suas histórias assim: __ E não é que eu tava com o Cuei de carro ontem de noite, na estradinha que vai pro estreito, quando o pneu estourou. Até que tava tudo bem! Descemos pra trocar o pneu, claro que eu fiquei só na manobra observando Cuei, dando umas coordenadas.
Nesse momento, todos se entreolharam, como que se já esperassem aquele tipo de atitude de Silvano, que não era muito dado a trabalhos manuais, preferia muito mais defender suas ideias. Sem dar muita importância, Silvano continuou.
__ Até que o Cuei nem demorou muito pra trocar o pneu, e enquanto conversávamos, ele me contou umas histórias de um anão fluorescente que andava na estradinha do estreito e que colecionava fotos 3x4 das pessoas que ele encontrava. Eu mesmo, que não sou muito dado a essas histórias não acreditei na hora, mas Cuei é meu amigo e de confiança, ele não ia inventar isso do nada.
Leôncio, o mais novo da turma, se segurava na cadeira para não rir com a conversa de Silvano. Foi quando ouviu Ronildo perguntar: __ Mas porque ele colecionava foto 3x4, Silvano? E como ele conseguia essas fotos? Embora fizesse cara de sério, Ronildo era sempre sarcástico, o que não agradava muito Silvano, que não deixou por menos e logo retrucou.
__ Rapaz, escute primeiro! Nem eu acreditei quando ouvi, até acontecer o que aconteceu. E assim se deu a história do anão fluorescente contada por Silvano, que não foi mais interrompido.
__ Escuta bem Silvano o que vou te contar, mas não se assuste. Nessa estrada, diz o povo que sempre passa um anão que fica brilhando de noite. Eu mesmo nunca vi, mas muita gente jura de pé junto que já viu esse anão fluorecente várias vezes.
__ Do que você tá falando Cuei? Que história é essa? Perguntou Silvano, enquanto enrolava um fumo e observava o amigo afrouxar os parafusos da roda.
__ Do anão fluorescente, Silvano! Diz a história que ele sempre aparece de noite, rouba as carteiras das pessoas, mas só leva fotos 3x4, e quando não as encontra, ele leva um documento que tenha uma. E enquanto limpava o suor da testa, Cuei olhava para os lados quase que prevendo o que estava para a acontecer.
__ Olha Cuei, um sapo falante e capaz de correr já era algo absurdo pra eu aceitar, agora você quer que eu acredite em um anão que brilha de noite e rouba carteiras? Nessa altura, silvano já havia fumado metade do cigarro e começava a ficar impaciente com a história do amigo.
__ É sério Silvano, um conhecido meu que sempre passava por essa estrada me disse que a toca do anão ficava escondida perto do estreito.
Nisso, Silvano deu um soluço e quase engoliu o cigarro, pois sabia que o estreito, lugar bem conhecido da região e cheio de histórias estava próximo. O estreito era um trecho de estrada de terra bem fino que cortava duas serras e era caminho necessário para quem quisesse visitar a lagoa do espraiadinho.
__ Mas ele costuma sair da toca e atacar as pessoas, ou só quando alguém passa por lá que ele aparece? Perguntou Silvano já se borrando todo.
__ Até onde sei ele costuma sair de noite, e anda bastante. A gente podia tentar ver se o encontramos.
Quando disse essas palavras, Cuei nem se dignou a levantar a cabeça para Silvano, que ficou chocado com a proposta do amigo e retrucou.
__ Tá maluco!? Tenho medo de anão, embora nunca tenha visto um. Eles me assustam, imagina ver um brilhando e querendo roubar minha carteira.
__ Mas eu sei um modo de hipnotizar ele. Segundo meu amigo, quando ele aparece ele já começa a brilhar e olhar fixamente pra pessoa, mas se alguém acender um fogo, ele fica hipnotizado com a luz durante algum tempo. A gente podia tirar uma foto dele e depois sair correndo.
Por mais que achasse toda ideia absurda, Silvano pareceu interessado.
__ Mas vamos fazer fogo com o que? Perguntou sem se dar conta que estava segurando um isqueiro.
__ Ora, enrolamos um pedaço de pano em um pau, ateamos fogo, e enganamos o anão. Disse Cuei enquanto guardava o macaco no porta malas após terminar o serviço. __ A gente enxarca o pano com a gasolina do carro pra ficar mais fácil.
E Silvano aceitou a proposta e se pôs a procurar um pano, foi quando percebeu.
__ Não temos nada pra queimar, Cuei. Nem um pano velho no carro, nem papel, nada mesmo!
Nesse momento, Silvano percebeu que Cuei estava totalmente imóvel com as mãos sobre o carro, e percebeu que uma certa luz verde começou a tomar conta do lugar. Sem ainda se virar para trás, Silvano começou a trocar olhares nervosos com Cuei que ora fixava o olhar para algo a sua frente ora fixava o olhar em Silvano tentando lhe dizer algo. Foi quando Silvano criou coragem de olhar para trás e viu uma das cenas mais grotescas de sua vida. Logo a frente do carro, se deslocava lentamente uma figura de aproximadamente um metro, vestido com uma peça única de pano e oscilando um brilho verde intenso que poderia iluminar um salão inteiro. Nesse momento, sua alma se congelou, e Silvano ouviu a voz arrepiante do anão fluorescente que disse: __ O que temos aqui, nessa noite clara e cheia de surpresas? Duas almas solitárias esperando pelo toque suave das mãos desse anão iluminado. Você será o primeiro!
E com olhar direcionado para Cuei, o anão se pôs a caminhar lentamente em sua direção, e parecia exercer um certo poder sobre Cuei que ficou imóvel, foi quando este gritou para Silvano: __ Rápido, Silvano, não fica ai parado. Acende logo essa tocha!
__ Mas não tem nada pra eu queimar, seu maldito!
__ Usa sua camisa, desgraçado! Pelo amor de Deus, esse bicho tá rindo pra mim e to congelado de medo.
__ Mas essa camisa é presente da minha mãe. Não posso fazer isso com a velha.
Nesse momento, Silvano ameaçou correr, mas não podia fazer isso com seu amigo, foi quando teve uma ideia. Às pressas, tirou sua calça, enrolou-a no pedaço de pau que havia encontrado, e ateou fogo à mesma. Sem pensar muito, se jogou na frente do anão, só de cueca, bituca na boca e a tocha na mão, apontou essa para o anão que ficou estático no mesmo instante. Sem saber se estava funcionando, Silvano começou a gritar: __ Pare agora, seu anão miserável, ou jogo essa tocha em você agora mesmo. Nesse momento, sentiu uma mão em seu braço e uma voz dizendo: __ Vamos sair correndo daqui seu maluco, ele já está hipnotizado.
E os dois se puseram a correr desesperados, deixando o carro para trás, e as calças de Silvano em chamas, que corria agora só de botinas, a camisa ganhada da mãe e o resto da bituca pendurada em sua boca.
E foi assim que Silvano contou sua história para os amigos na venda do seu Odair, que mais uma vez ficaram abismados com a capacidade imaginativa e com a narração rica em detalhes feita por Silvano. E foi assim que toda a cidade de Tripolândia passou a ter conhecimento do anão fluorecente que roubava carteiras para colecionar fotos 3x4. E foi assim que Silvano e Cuei, o amigo até hoje desconhecido, fugiram do anão risonho e verde.




3 comentários:

  1. Tubarão de água doce flertando com uma velha, ainda por cima rabugenta? Literalmente têm muito a se pensar...kkkkkkkkkk. Parabéns pelo causo "Fêssor"!!!

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  2. Muito obrigado, Cesar. Logo logo teremos mais causos de Silvano.

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  3. Nos próximos poderia ter uma Galinha D'Angola Gigante, ou uma comunidade anarquista de tartarugas atéias...já penso no causo da Super Coruja soltando raios metafísicos, silogismos flamejantes e o "super soco da falácia"...rsrsrsrsrs! Muito legal professor...

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